Presidente do Flamengo fechou com a CBF?
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Foto: Gilvan de Souza / Flamengo |
HUMILDADE EM GOL: Aderiu ou não aderiu? Vacilou ou não? O que significou o fato de Eduardo Bandeira de Mello, presidente do Flamengo, ter aceitado o convite da CBF para chefiar a delegação da Seleção Brasileira na Copa América, nos Estados Unidos? De imediato, o gesto provocou a ira de grande parte da torcida rubronegra nas redes sociais. Que, como todos sabem, são tribunais de exceção, onde a promotoria se encarrega não apenas das acusações como também dos vereditos e das aplicações das penas. Bandeira saiu chamuscado dessa corte digital não apenas porque disse “sim” ao convite como também não se furtou a aparecer ladeado por Dunga e Gilmar Rinaldi no anúncio dos convocados para o torneio. Levou chumbo vindo de todas as direções.
Eu também não curti muito o anúncio do que imaginei ser a adesão do Flamengo à turma da CBF. Fiquei bolado, mas curioso para entender o que o Presidente do Flamengo tinha para se meter com aquela rapaziada da CBF. Humildemente, entrei em contato com o Flamengo para ver se podia conversar com o Presidente sobre a controvertida decisão. Para minha surpresa, eles toparam e lá fui eu pra Gávea com meu gravadorzinho entrevistar o homem. Provavelmente o fato de eu ter trabalhado durante 14 meses no Departamento de Comunicação do Flamengo ajudou a abrir essa porta. E como o tempo era curto, pulei a parte dos salamaleques de praxe e fui logo perguntando ao mandatário rubronegro se a descomunal diferença entre a imagem que o Flamengo vem construindo, a do clube cidadão, não era incompatível com a imagem arranhadona da CBF. Bandeira respondeu que o Flamengo é um clube cidadão, reconhecido por seus princípios e valores e que nunca deixou de se relacionar com a CBF. Que é do interesse do Flamengo participar e dar sugestões.
“Nós fazemos parte, disputamos as competições organizadas pela CBF e queremos que a CBF mude pra melhor.”
Para Bandeira é uma obrigação participar e tentar fazer com que prevaleçam os princípios e valores do Flamengo lá dentro e isso tem acontecido, segundo ele. Bandeira diz que até tentou fazer a mesma coisa na FERJ, cuja credibilidade, já há alguns anos, não é das mais robustas. Mas a tentativa de dialogar com a FERJ fracassou, deu naquele episódio que todos conhecem e o obrigou a partir para o rompimento total.
Pessoalmente não vejo muitas diferenças entre a FERJ e a CBF, pra mim é tudo coronelato. Mas o presidente do Flamengo discorda e enxerga um movimento na entidade que está plantando para ações modernizantes. Para meu espanto, diz que a CBF implantou um sistema de governança corporativa desenvolvido pela Ernst & Young, uma empresa de credibilidade internacional. E que estão com um projeto da agenda de mudanças trabalhando em uma serie de grupos de trabalho onde surgirão propostas de transformação para o futebol brasileiro e que o Flamengo participa de todos eles.
E por mais que parte da torcida e da imprensa caísse de pau por ter aceitado o convite, Bandeira diz que convite para chefiar a delegação foi entendido por todos no Flamengo como uma sinalização positiva da CBF no sentido de se aproximar dos princípios e valores que o Flamengo vem defendendo e não o contrário. E que além do mais, foi convidado para uma função honorífica, que não implica em nenhuma participação na administração da entidade. Menos mal, porque com ou sem essas ações modernizantes, os dirigentes da CBF não gozam atualmente de nenhuma confiança por parte da massa compradora de ingresso e payperview.
É natural que o torcedor rubronegro tenha essas prevenções, afinal a CBF deu canseira no Flamengo na questão da Primeira Liga, até agora não liberou os jogos do Flamengo que serão disputados em Brasília durante o Campeonato Brasileiro… enfim, a CBF não é a BFF do Flamengo. Mas na histórica questão de 87, Bandeira inocenta a CBF:
“No caso de 87 acho que a CBF está inocente. Eles reconheceram o Flamengo como campeão de 87, só que aí veio a Justiça, provocada pelo Sport Recife, impedindo que a CBF fizesse esse reconhecimento. Esse caso hoje está no Supremo (STF), que é quem vai decidir se a CBF pode ou não reconhecer o nosso título. Mas que o Flamengo é o campeão todo mundo sabe… 1 x 0, gol do Bebeto, eu estava lá, você também, todos nós. E isso daí é liquido e certo. Todo mundo sabe quem é o campeão brasileiro de 1987. Acho até que essa insistência do Sport Recife é mais uma daquelas tiradas de bom humor pernambucano, que dizem que o Oceano Atlântico é formado pelo encontro das águas do Beberibe e do Capiberibe ou do prefixo da Rádio Jornal do Comércio que transmitia do Recife para o mundo. E agora dizem que o verdadeiro Zico era o que jogava no Sport, aquele que ninguém sabe escalar. Enquanto isso, Zé Carlos, Jorginho,
Leandro, Edinho, Leonardo, Andrade, Ailton, Zinho, Renato Gaúcho, Bebeto e Zico todo o Brasil sabe de cor. Tenho grandes amigos pernambucanos, as origens da minha família estão em Pernambuco e isso daí a gente tem que levar na brincadeira. Não é um problema entre o Flamengo e a CBF.”
Ainda que a CBF esteja limpeza nesse imbróglio com o Sport, quando a torcida rubro-negra pensa em CBF os nomes que vem à cabeça, fora os dos dirigentes atuais que estão todos enrolados, são Nabi Abi Chedid, Eurico Miranda, Andreis Sanchez. Tem como não ser prejudicial à imagem do Flamengo a associação do seu presidente com essas pessoas de biografia tão controvertida?
“Não acredito nisso, não. Se o nosso objetivo é levar para a entidade que administra o futebol no país os valores e os princípios que abraçamos no Flamengo, que continuam rigorosamente os mesmos, não vejo nenhum prejuízo à imagem do Flamengo. Nosso desejo é que esses valores sejam abraçados pelo futebol brasileiro como um todo. Recebi muitas criticas, inclusive de amigos, na época em que estávamos brigando pela aprovação do ProFut e eu fui ao Palácio do Planalto, participei da cerimônia junto à presidente da república, o ministro, presidente da Câmara, do Senado, etc.
Pra começar o Flamengo não pode participar de política partidária. das restrições que os torcedores façam ao governo federal, era fundamental para o Flamengo participar, independente de críticas. E não me arrependo, ao contrário, conseguimos aprovar a Medida Provisória que depois virou a lei 1395, o que foi extremamente benéfico para o clube. Reduzimos nossa dívida em 90 milhões, reescalonamos nossa dívida tributária em 240 meses e conseguimos aprovar todos aquelas normas chamadas de contrapartida que farão com que todos os clubes tenham a mesma responsabilidade fiscal que o Flamengo pratica. Quando você está convicto, e absolutamente tranquilo, de que está fazendo a coisa certa, o melhor para o Flamengo, a imagem é a menor das nossas preocupações. E não cabe a nós fazer julgamentos sobre quem a CBF convida para colaborar. Assim como o Flamengo nunca se negou a participar de todas as reuniões da FERJ até que aquele fatídico 15 de janeiro de 2015, nós sempre participamos de todos os fóruns da CBF e sempre tive um relacionamento institucional com todas as instâncias de poder, seja prefeito, governador, ministro ou presidente. O Flamengo está acima de tudo.”
Acontece que o público em geral, e da internet em particular, é muito mais impactado pela imagem, pelo meme, do que pelo fato em si. A cena do presidente do Flamengo sentado entre Gilmar e Dunga durante o anuncio da convocação da Seleção pareceu que o presidente do Flamengo foi jogado ao leões naquele momento, já que fugiu totalmente aos padrão das convocações anteriores. Era uma imagem muito forte e que provocou repúdio imediato nas redes sociais. O senhor não se sentiu usado naquele momento?
“Se eu não estivesse sentado à mesa, seria o Chefe da Delegação da mesma maneira. Eu não vejo nenhuma razão para se dar mais importância à imagem do que ao fato. Particularmente, não vi problema algum e não me senti constrangido no papel de urubu entre os leões. Eu estava lá, sendo anunciado naquele momento como Chefe da Delegação, não vi qualquer problema.”
Mas a imagem deu margem para que surgisse a ideia de que o senhor seja vaidoso e de que estivesse se associando “a quem não fecha com o certo”. O senhor não considera isso um dano a sua imagem?
“Ou eu sou um cara vaidoso ou eu não dou importância pra imagem. Normalmente a pessoa vaidosa é muito preocupada com a própria imagem. Se eu estava lá “maculando” a minha imagem, então eu não sou vaidoso. O Flamengo é muito mais importante do que qualquer cargo ou honraria, CBF, Federação. Ser presidente do Flamengo, não era algo que estava no meu radar, que aconteceu na minha vida e eu acabei tendo uma projeção que jamais imaginei ter. Quem tem a projeção por ser presidente do Flamengo vai aceitar um cargo na CBF por vaidade? Isso é uma gota d’água no oceano. Ser chefe de delegação, que muita gente dá uma importância muito maior do que efetivamente tem, eu entendi como uma homenagem. E perto da Presidência do Flamengo isso é nada. Mas todos têm o direito de me julgar e de fazer a sua avaliação sobre aquele fato. Eu tenho consciência de que não poderia tomar nenhuma atitude pensando no que as redes sociais iriam pensar de mim. Em nossa administração temos tomado muitas medidas impopulares, fazem parte do processo, e quando você age de maneira bem intencionada, a sua boa intenção vai aparecer lá na frente. Considero muito a opinião da torcida, mas prefiro tomar decisões pensando no que é melhor pro Flamengo”.
Presidente, o senhor colocou alguma condição para aceitar o convite da CBF?
“Não, porque seria até falta de educação condicionar a minha resposta ao convite a algum compromisso de que a CBF agisse assim ou assado no Grupo de Calendário ou no Grupo de Transparência. A posição do Flamengo continua a mesma e não imagino que a posição da CBF vá mudar em função da minha participação ou não na delegação da Copa América. A CBF sabe que estamos participando desses grupos e sabe que nosso objetivo é a aprovação das medidas modernizantes e, a partir do momento em que somos homenageados, sinto que é uma sinalização positiva à postura do Flamengo. Em relação à Primeira Liga, que num primeiro momento foi interpretada erroneamente como uma liga pirata, como uma rebelião, quando o que queríamos era uma alternativa técnica e financeira aos estaduais, que são uma tragédia econômica durante os quatro primeiros meses do ano. Acho que a Primeira Liga veio pra ficar e que em 2017 ela estará ainda mais forte. Não queremos atrapalhar a vida de ninguém, queremos, simplesmente, que o futebol brasileiro evolua e que os clubes possam ter melhores alternativas pro seu calendário.
O torcedor de arquibancada Eduardo Bandeira de Mello, se não fosse o presidente o do Flamengo, entenderia a postura que o Presidente Bandeira adotou em relação à CBF?
“É difícil dizer qual seria minha reação se eu não tivesse acesso à todas as informações que possuo no momento. Mas posso dizer que respeito a opinião das pessoas e que eu sei que entre os meus críticos existem pessoas altamente bem intencionadas, são pessoas do bem, que querem o melhor pro Flamengo e se posicionaram de maneira contrária. Talvez o tempo prove, lá na frente, que elas estão certas e que eu não deveria ter tomado a decisão que tomei. Mas não dá pra saber o futuro hoje, se fosse possível talvez estivéssemos já comemorando o nosso desempenho no Brasileiro, a cotação das ações da Petrobras etc. Mas não duvido das boas intenções de 90% dos meus críticos.”
Uma preocupação que é comum tanto aos bons quanto aos mal intencionados é: como fica o Flamengo durante um mês sem seu presidente?
“Essa foi a única observação que fiz à CBF quando recebi o convite: não posso largar o Flamengo, qual é a natureza das minhas funções? Hoje em dia, com a tecnologia das comunicações, você pode perfeitamente cumprir suas obrigações estando à distância, fora do Flamengo. Estando em San Diego ou na Flórida, na Barra da Tijuca ou Brasília, não tem muita diferença. Vou participar da vida do clube normalmente, como já participo. Vou conversar todos os dias com os diretores, com os vicepresidentes, com o vicepresidente que vai me substituir ou com a imprensa. Na grande maioria das corporações o presidente viaja e continua trabalhando. Aqui no Flamengo nós temos um vicepresidente que é confiável, que já me auxilia mesmo quando estou aqui e que quando eu voltar vai continuar me ajudando. O Flamengo vai ficar em boas mãos.”
Por Arthur Muhlenberg