Torcida do Palmeiras e o amadorismo da diretoria do Flamengo.
ESPN: No duelo de Brasília a superioridade do Palmeiras sobre o Flamengo foi evidente. O gol da vitória aconteceu no segundo pênalti cometido pelos zagueiros rubro-negros — o primeiro, de Leo Duarte, foi absurdamente ignorado. Nas arquibancadas, os palmeirenses, em minoria, mas em grande número, saborearam um “olé” como se estivessem em São Paulo, reflexo das tolas, pueris decisões dos cartolas flamenguistas.
Cuca foi mais feliz na escalação e alterações no duelo com Zé Ricardo. Mas não seria justo cobrar tanto do inexperiente treinador, que teve pouco tempo para tentar arrumar a bagunça de time herdado de Muricy Ramalho, cuja contratação foi comprovadamente um imenso erro dos dirigentes. Mas ele pode ter aprendido uma lição básica: escalar os melhores. Cuellar e Mancuello na reserva é inexplicável.
Reflexo do trabalho dos dois treinadores, o que se viu foi o Palmeiras dominar amplamente desde o primeiro tempo. Com exceção da parte inicial da etapa final, o Flamengo não conseguiu controlar a peleja. Mais do que diferenças técnicas neste ou naquele setor, a montagem dos dois times pesou. E fica cada vez mais claro como os palmeirenses perderam tempo insistindo com Marcelo Oliveira.
Mas entre os cartolas há um capítulo à parte. Discordo de muitas decisões do presidente Paulo Nobre e sou crítico dos 3% a 4% de ingressos que destina aos visitantes no Allianz Parque, apoiado numa polêmica recomendação do Ministério Público (pelo regulamento seriam 10%). Mas nada se compara à postura ingênua dos dirigentes do Flamengo nesse quesito. E em Brasília isso ficou novamente claro.
O anel superior do estádio no Distrito Federal era todo do Flamengo, exceto no setor destinado aos visitantes, com 5,8 mil lugares. Se fosse só isso seria o cumprimento da lei. Mas os generosos cartolas da Gávea, obviamente mirando uma gorda arrecadação, permitem que os rivais comprem ingressos em todo o anel inferior. Resultado, ali perto do campo, havia grande equilíbrio na quantidade de torcedores dos dois times.
Muita gente elogia, acha bonito, uma graça, simpatizantes dos clubes que se enfrentam lado a lado acompanhando a bola rolar. É, seria lindo se existisse reciprocidade. Muito pelo contrário. Rubro-negros que vão aos jogos fora de casa sempre se queixam de localização ruim, longe do gramado, dificuldade na compra de ingressos, má recepção no local do jogo e até preços bem mais altos do que os pagos pelos locais.
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Setor onde ficou confinada a torcida do Flamengo no Allianz Parque no estádio em 2015 – Foto: Divulgação |
“Nesse jogo em Brasília a torcida do Palmeiras comprou muito dos ingressos na zona mista, o que ajudou a termos recorde de público no brasileiro”, disse ao blog o CEO do Flamengo, Fred Luz. Perguntado por que o Flamengo permite imensos setores mistos, o que amplia a presença de torcedores rivais, reduzindo a sensação de mando de campo, se é pelo dinheiro, respondeu:
“Hoje, aqui em Brasília , tivemos pela primeira vez um caso onde a torcida adversária foi expressiva. E os ingressos não esgotaram. Não faltou ingresso para o torcedor do Fla que desejou ir ao jogo”, argumentou.
Insistimos no questionamento ao dirigente: se a torcida rubro-negra é confinada a um pequeno espaço nos estádios como o do Palmeiras, por que a diretoria do Flamengo permite aos torcedores rivais ficarem espalhados confortavelmente em Brasília como aconteceu com os corintianos no Maracanã em 2015? A resposta de Luz: “O Flamengo não deve ter praticas ruins só porque outros praticam”.
Pelo jeito ele não consegue enxergar a interferência técnica e o deleite do rival de seu clube por poder ir a uma partida “fora de casa” e se sentir “em casa”. Digamos que em troca de tamanha receptividade os palmeirenses concedessem 20% dos ingressos aos rubro-negros na partida de volta, algo em torno de 8 mil. Seria até aceitável. Mas isso não acontecerá, chance zero. Quando forem a São Paulo, os jogadores de preto e vermelho não ficarão confortáveis como os do Palmeiras na foto acima.
Na administração atual já executaram hino do Corinthians no Rio de Janeiro e o time carioca levou sova de 3 a 0 que só não foi pior pela piedade do rival. Antes, estranhamente o presidente Eduardo Bandeira de Mello, que está com a seleção nos Estados Unidos, aceitou imposição corintiana. Mesmo endividados, dirigentes paulistas deram as cartas e proibiram a escalação de Sheik e Guerrero no cotejo. Bizarro.
Na oportunidade, o “Salve o Corinthians” ecoando pelo Maracanã foi atribuído ao consórcio. Mas o que explica o Flamengo permitir áreas mistas em Brasília quando o estádio é “dele” nos dias em que joga lá? Se o clube assumiu até a responsabilidade de cuidar de um gramado, poderia tratar o torcedor visitante como os rubro-negros são tratados fora de casa, colocando-os em local específico. Longe do gramado.
Se o Flamengo levou perto de 30 mil pessoas ao Fla-Flu do Pacaembu, certamente dividiria o estádio se Palmeiras ou Corinthians lhes dessem tal chance. Já aconteceu no Morumbi, em 2008 (vídeo abaixo), quando o São Paulo resolveu ampliar os setores destinados aos rubro-negros, de olho na arrecadação. Mas palmeirenses e corintianos jamais farão isso. Nem se precisassem de ajuda para lotar suas “arenas”.
E estão corretos. Mando de campo se define a partir de alguns fatores, e o número de torcedores é muito relevante, pois cria a atmosfera favorável ao dono da casa e inóspita para o visitante. Esta não é uma defesa de ações violentas, mas da preservação de uma tradição. Nela, mandante, a priori, manda. Já em clássicos o ideal é torcidas dividindo estádios, independentemente de quem tenha o mando, pois ambos são locais.
O resultado do domingo em Brasília foi a “festa no chiqueiro”, com vitória e palmeirenses à vontade, algo que os dirigentes paulistas não dão a nenhuma outra torcida em sua casa. De quebra o “olé”, quando os milhares de torcedores verdes celebravam a aproximação da vitória. Certíssimos, afinal, quem recusaria tamanha hospitalidade dos cartolas rubro-negros, seus recordes de público e surras em campo?
* Como se não bastasse, a organização (?) do jogo permitiu torcidas inimigas sem um esquema de segurança competente. Já ocorrera num Vasco x Corinthians no mesmo estádio. Houve elementos detidos, mas a tendência, como sempre, é serem liberados e seguirem por aí. Brigando. O Brasil é violento e nele impera a impunidade. No futebol não poderia ser diferente. Mas num espetáculo privado o mínimo que deveria ser oferecido a quem por ele paga é ficar em segurança. Um desastre.